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A cultura antissindical no Brasil decorre da abusividade praticada

ago132018

As entidades sindicais, tanto econômicas quanto profissionais, têm a prerrogativa do sindicato, como sinônimo de poder, de representação, lato sensu, das bases em que se encontra, no sentido de ser a voz e a atitude da categoria representada na defesa dos interesses atinentes à relação de trabalho e ao plano social mais largo.

Amauri Mascaro Nascimento, em seu Compêndio de Direito Sindical, p. 252-256, assevera que, embora haja divergências sobre as funções que ao sindicato devem ser permitidas, são reconhecidas às organizações sindicais as funções de representação e a negociação, sendo controvertidas as demais (funções: assistencial, parafiscal e política).

No nascedouro, o direito sindical surge com intuito de normatizar as relações do trabalho de modo mais específico e a negociação coletiva como instrumento de composição dos interesses dos trabalhadores e empregadores nas relações de trabalho.

Contudo, há de ser observada a legalidade, a licitude e abusividade que podem envolver a natureza material de uma cláusula.

Como exemplos extremos da autoridade intrínseca ao ente sindical profissional, podem ser citadas as cláusulas referentes aos estivadores:  salário-vexame (por carregar latrinas e bidês), salário-frio, salário-roupa e até salário-chuva (salário em dobro caso chovesse mais de meia hora no período noturno).

Algumas dessas cláusulas datam da década de sessenta, porém a imposição de cláusulas abusivas era característica na época em que as grandes greves violavam sua função social, por serem prolongadas, conduzindo a empresa à ruína e por vilipendiar a função econômica. O exercício do direito de greve somente veio em 1989, com a Lei nº 7.783.

O Direito Coletivo do Trabalho foi evoluindo num passo mais lento do que as relações de trabalho, que requeriam uma modernização trazida pela tecnologia a partir dos anos noventa, com as comunicações on-line na época do acesso discado à rede de computadores.

O ente sindical laboral representava o lado hipossuficiente, aquele que deveria ser protegido do “monstro” capitalista, e assim, possuía prerrogativas de determinar cláusulas que caracterizavam abuso ou até mesmo ilicitude:

  1. a) cláusula closed shop, pela qual o empregador somente pode contratar empregado sindicalizado;
  2. b) cláusula union shop, mercê da qual o empregador se compromete a manter apenas empregados, que, após prazo razoável de sua admissão, se filiem ao respectivo sindicato operário;
  3. c) cláusula preferencial shop, que favorece a contratação de obreiros filiados ao respectivo sindicato;
  4. d) cláusula maintenance of membership, pela qual o empregado inscrito em certo sindicato deve preservar sua filiação durante o prazo de vigência da respectiva convenção coletiva, sob pena de perda do emprego;
  5. e) cláusula agency shop, pela qual se impõe aos empregados não sindicalizados o pagamento de contribuições sindicais;
  6. f) cláusula yellow dog contract, em face da qual o trabalhador firma como seu empregador um compromisso de não filiação ao seu sindicato como critério de admissão e manutenção do emprego;
  7. g) cláusula company unions, em que o próprio empregador estimula a criação de sindicatos artificiais pelos seus empregados.

Havia normas coletivas que previam abuso por parte do sindicato patronal no sentido de prejudicar a empresa, negociando reajuste superior à capacidade econômica das empresas representadas, sob pressão dos trabalhadores, e ainda, revistas pessoais dos empregados, em detrimento de direito fundamental dos trabalhadores.

Ante a abusividade dos atos jurídicos, podem ser adotadas sanções diretas, pela qual se concretiza a reparação in natura, restituindo-se as partes o estado anterior, sem prejuízo da reparação civil pertinente, e a sanção indireta, adotada no caso de impossibilidade de retorno à situação anterior, em que o ato abusivo fica mantido, sendo devida a indenização reparatória material e moral, com a análise do caso concreto.

Com o objetivo de coibir cláusulas normativas com aparência de salário, quando se tratam de expediente meramente fantasioso, e lhes atribuir a efetividade monetária que o trabalhador busca para a sobrevivência, o legislador da Reforma Trabalhista, nos artigos 611-A e 611-B da CLT, dispõe a respeito das possibilidades de negociação e suas proibições em determinadas matérias, devendo ser respeitada a autonomia privada coletiva de apresentar as propostas (art. 104 CC art. 8º § 3º da CLT), submetendo-se à análise dos elementos essenciais do negócio jurídico.

Enquanto isso, espelhando-se na conduta sindical, com efeito contrário, ao salário do alto escalão da esfera pública, agrega-se regalias infinitas para cumprir o teto constitucional de R$ 33.763,00[1], visando arrancar da máquina pública exorbitantes quantias disfarçadas de auxílio-paletó, auxílio-moradia, e por último o auxílio-esposa (para homens casados que a esposa não trabalhe). O impacto causado no orçamento consiste numa verdadeira sangria aos cofres públicos e ao bolso do cidadão, que permanece na carência de serviços básicos como saúde, educação e segurança.

É o momento de observar a situação econômica do País, compreendendo a necessidade de adequação das normas coletivas a essa realidade, revendo as reivindicações das categorias laborais com vistas às oportunidades de negociação que a Lei nº 13.467/17 proporciona e ponderar as condições das empresas em cumprir o acordado sem prejuízo de sua continuidade.

[1] Teto do servidor público federal.

 

Janaína Braga de Souza Valente – Advogada

Flora & Camargo – Advogados Associados

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